segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

COLUNA MEMÓRIA ORAL

Com: Fernando Afonso Salla

Meu nome é Fernando Afonso Salla e sou sociólogo.  Em 1985, eu vi um cartaz no metrô informando que havia sido aberto um concurso público pra diversas carreiras do sistema penitenciário, e a novidade é que havia sido aberta uma vaga para minha área. Fui aprovado no concurso e comecei a trabalhar no Centro de Recursos Humanos da Administração Penitenciária. 
O fato de trabalhar na área de recursos humanos permitia, aos chamados técnicos (psicólogos, sociólogos e assistentes sociais), circular constantemente pela estrutura penitenciária,  para fazer concursos, treinamentos, etc. Assim, tive a oportunidade de conhecer o interior das prisões de São Paulo, que naquela época se limitavam a apenas 50 unidades.

Depois voltei para Universidade e comecei meu mestrado e depois o doutorado. Neste período, não tinha ninguém estudando os estabelecimentos penitenciários. E como a minha vida profissional me permitiu conhecer muito da estrutura prisional, utilizei esta experiência profissional numa reflexão acadêmica.
Refletindo sobre a história da pena, podemos afirmar que, no mundo moderno, o encarceramento enquanto punição representou um importante papel na mecânica das concepções e aplicações das penas, pois o encarceramento se destacou por constituir pena que confiscava a liberdade, o “bem” ao qual todos os indivíduos, elevados à condição de cidadãos, tinham direito.
Na Europa e nos Estados Unidos, a pena de prisão acompanhou a ampliação dos direitos do indivíduo como cidadão. No Brasil, entretanto, esta mesma pena começou a ser utilizada quando ainda se conservava uma estrutura social cindida pelo escravismo e pelas diferenças e distâncias no acesso dos indivíduos à lei. O caráter de que foi revestido o Código Criminal de 1830 evidencia um momento de transição entre as Ordenações Filipinas, que contemplavam a pena de morte, e o Código Penal da República, de 1890, onde é suprimida a aplicação deste tipo de pena. Portanto, o Código Criminal do Império apresenta um caráter híbrido, dado em primeiro lugar pela sobrevivência de penas já existentes nas Ordenações Filipinas: morte, galés, degredo, etc.; em segundo lugar, pela manutenção das penas cruéis e infamantes; em terceiro, porque foi atribuída à maioria dos crimes a prisão com trabalhos. 
Apenas na Corte (Rio de Janeiro) e em São Paulo foram criadas prisões próprias para dar cumprimento à prisão com trabalho. Na Província de São Paulo, as penas de prisão com trabalho foram aplicadas na Casa de Correção, criada em 1852. Nas outras províncias, houve tão somente uma adaptação de antigos estabelecimentos prisionais. 
Olha, esse tipo de informação histórica eu consegui como fruto do meu trabalho na estrutura penitenciária. Minha permanência na área prisional foi muito rica nesse sentido, de trabalhar e, de certa forma, de abrir a possibilidade de avançar numa trilha de reflexão acadêmica, na qual eu atuo até hoje. Entendo que o mais importante para bom profissional é se dedicar àquilo que faz e sempre fazer bem feito. E, para as pessoas que hoje trabalham no sistema penitenciário, lembro que sempre é importante alimentar sonhos para o constante desenvolvimento.